CBRGS- Qual seu interesse pelos bascos ?
Tomei conhecimento da “questão basca” ainda na escola, como aluno. A visão não era muito
positiva. Os professores de Geografia da educação básica, em geral, só conheciam os bascos
pela face das ações do ETA. Davam muito mais ênfase ao terrorismo do que às restrições
franquistas às liberdades dos bascos na Espanha. A identidade não ocupava posição central
nas discussões.
Mas eu sempre tive interesse pelas diferentes culturas e os bascos me despertavam atenção,
em especial pelas particularidades de sua língua, muito diferente de tudo o que há no contexto
geográfico em que ela se insere.
Mas foi quando soube que minha bisavó tinha origens bascas que o interesse antropológico
se converteu numa simpatia familiar e numa inesperada sensação de identidade e
pertencimento. Não conheci minha bisavó. Ela faleceu há 50 anos. E meu avô, filho dela,
faleceu quando eu tinha apenas dois anos. Mas essas coisas que envolvem elos familiares, às
vezes, simplesmente não se explicam. Eu me identifiquei.
CBRGS - Qual foi a sua maior influência, ou maior motivador a manter esta relação com o país
de origem dos ancestrais?
Sempre gostei de História e Genealogia. As facilidades que as tecnologias nos facultam hoje
me permitiram aprofundar-me nesses campos de interesse. Sou do tipo que se comove
profundamente quando descobre, num registro de casamento, que o trisavô era um ebanista
(marceneiro) e que o pai dele era um herrero (ferreiro).
Isso aconteceu com pesquisas no campo da ancestralidade basca. Investigar esse passado
familiar tem reforçado bastante esse sentimento de identidade que tenho construído nos
últimos anos com essa comunidade.
CBRGS - Conhece o País Basco?
Nunca pisei no velho mundo. Com dois filhos muito pequenos, adiarei por mais alguns
(poucos) anos a viagem. Pretendo ir com minha esposa assim que possível e entre nossas
prioridades estão destinos familiares, especialmente em Espanha e Portugal, de onde vêm
nossos ancestrais imigrantes mais próximos.
Isso certamente inclui o País Basco. E os centros especializados que guardam arquivos
históricos. Sem dúvida! São meu paraíso particular. Pra minha sorte um desses centros fica
exatamente na cidade em que minha bisavó nasceu, em Derio, Biscaia. Parada obrigatória.
CBRGS - Quais as informações que dispõe sobre o País basco?
Como professor de Geografia do ensino médio e de pré-vestibular, posso dizer que aprendi
o suficiente para corresponder ao ensejo dos meus alunos, numa medíocre perspectiva
utilitarista – reconheço – em sua intenção de entrar numa faculdade. Eles precisam conhecer
o nacionalismo basco e a luta armada do ETA. Durante muito tempo, era o que eu sabia
reproduzir sobre o País Basco, além daquilo que qualquer consulta ao Atlas pode responder,
como relevo, clima, vegetação, hidrografia, nomes de províncias, capitais, etc. Pra isso nenhum
deles precisa de mim.
No entanto, padecemos de uma absurda escassez bibliográfica sobre o tema no Brasil. Hoje
tenho o livro de Ana Luiza Panyagua Etchalus como uma referência, reconhecendo o esforço
do seu trabalho no levantamento e sistematização de informações relevantes sobre o assunto.
A importância da casa, a estrutura matriarcal, a religiosidade ancestral, o sistema jurídico,
entre tantos outros aspectos ali presentes trazem uma contribuição muito valiosa para que os
brasileiros como um todo conheçam mais sobre os bascos.
CBRGS - Fez a árvore genealógica de sua família. Teria interesse em apresentá-la aos bascos
brasileiros?
Quando buscamos nossa ancestralidade pela via genealógica nós temos a certeza de que
começamos um trabalho muito difícil. Por isso é importante estabelecer metas e tentar
cumpri-las. É muito bom quando as alcançamos e podemos nos propor metas mais ambiciosas.
Comecei esse levantamento de minha ancestralidade basca em casa, ouvindo familiares. Com
eles obtive os primeiros dados, especialmente com minha tia-avó Maria Larrabeiti, única filha
viva de minha bisavó. Com ela descobri os nomes dos pais de minha bisavó basca que migrou
para o Brasil: foi a primeira geração. Descobri com ela também bem a o local e a data de
nascimento dela: Derio, 16 de agosto de 1882. Foi meu ponto de partida. Depois achei os avós
dela: foi segunda geração.
Estabeleci como meta seguir completando gerações sucessivas e hoje tenho cinco gerações
completas e mais da metade dos indivíduos da sexta geração de ancestrais bascos de minha
bisavó. Já encontrei alguns da sétima geração. São 124 ancestrais até o momento, em 18
meses de pesquisas. E esse número vai crescer, estou certo disso.
Tenho o maior prazer em compartilhar os resultados desse trabalho. Abaixo pode-se ver a
árvore de minha bisavó, com quatro gerações completas de ancestrais, ou seja, até os trisavós.
Árvore Genealógica |
Repare quantos sobrenomes diferentes, quantas famílias numa só. Só nessa imagem temos
Larrabeiti, Goiri, Manzarraga, Vidaurrazaga, Iturreguy, Aspe, Goicoechea, Maurica, Arechaga,
Uribarri, Acha, Landaluze, Landaguren, Hormaeche, Torrontegui, Legarreta, Enderica,
Horbegozo Torre, Amezaga, Picaza, Berganza, Gorordo, Ugarte, Aguirre, Elguezabal, Orroño,
Urrutia, Eguzquiza e Pinuaga. E acima temos muitos outros.
Encontrei também muitos irmãos e primos desses indivíduos totalizando centenas de
familiares consanguíneos. Usando as ferramentas do site de genealogia Geni.com. onde exerço
as funções de curador, consegui encontrar descendentes dessas pessoas vivendo na Espanha.
Como o site permite a formação de uma grande “árvore mundial”, consegui, através do meu
trabalho, juntar minhas informações às informações de outros bascos espanhóis e confirmar
nossos parentescos.
CBRGS - O que te moveu a ofertar este trabalho para outras famílias?
Eu sou apaixonado pelo prazer dessas descobertas. E quero poder contribuir para que as
pessoas também possam descobrir mais sobre sua ancestralidade. E a gente tem grandes
chances mesmo de acabar encontrando parentes, mesmo que muito distantes, às vezes nem
tanto assim.
Ilustro com uma história. Tenho duas alunas. Karen Wajnztok e Adriana Wainstok. Elas se
conheceram na escola e estudavam na mesma turma. Um dia eu disse a elas: tem certeza
de que vocês não são parentes? Uma comentou sobre a rua onde morava e a outra passou
essa informação para o seu avô. Pronto. O avô de Karen e o bisavô de Adriana eram primos.
As famílias estavam separadas há décadas e se reencontravam a partir dessa descoberta.
Ninguém faz ideia da minha emoção por ter contribuído pra isso.
CBRGS - Como chegou à Casa Basca do RGS e qual a impressão sobre o trabalho que vem
sendo realizado pelo grupo que está na organização?
A Casa Basca do Rio Grande do Sul surgiu pra mim através do facebook. Num dia em que
estava extremamente envolvido com as pesquisas, achei a página “Bascos no Brasil” e “curti”.
Ao mesmo tempo, na outra aba do navegador, eu comprava o livro “Alma Basca”, de Ana Luiza
Panyagua Etchalus. Minutos depois, a própria Ana Luiza me solicitou amizade na rede social.
Segredos de Mari? E foi através de Ana Luiza que conheci a Casa Basca do Rio Grande do Sul.
Acompanho à distância o trabalho realizado e encaro-o como uma maravilhosa iniciativa
cultural e comunitária, da qual espero, um dia, poder participar com minha presença e de
minha família.
CBRGS - Qual a sua expectativa em se integrar ao Grupo da Casa Basca do RGS, mesmo
residindo no Rio de Janeiro?
Minha expectativa é ótima. Tomo o conceito do sociólogo espanhol Manuel Castells, expresso
no livro “A sociedade em rede”: vivemos a “cultura da virtualidade real”. O trabalho que posso
realizar contribuindo com a Casa Basca do Rio Grande do Sul, apenas se valerá das redes
virtuais. Mas seu produto será absolutamente real. Essa é uma possibilidade do mundo novo
em que vivemos.
Nos dias de hoje, no convívio social, muitas vezes interagimos muito mais através das redes
sociais do que pelo contato direto e pessoal com nossos amigos e vizinhos, não é mesmo?
Temos e-mail, facebook, twitter, skype e o bom e velho telefone. Creio que a distância não
será um obstáculo mas um motivador ainda maior para conhecer pessoalmente todos os
envolvidos nesse projeto sensacional.
Casa onde nasceu minha bisavó, em Dério, Biscaia. Larrabeiti Etxea. |
Minha bisavó, Pura Larrabeiti Goiri (b.16/08/1882 – d.29/08/1963) |
Francisca Larrabeiti Goiri, irmã de Pura. (b.02/04/1873) |
Ambrosio Maria Larrabeiti Goiri, irmão de Pura. (b. 08/12/1875) |
Bonifacia Larrabeiti Goiri (Boni), irmã de Pura. (b.14/05/1880) |
Juan Larrabeiti Goiri, irmão de Pura. (b. 27/12/1884) |
Presentación Larrabeiti Goiri (Presen), irmã de Pura. (b. 26/06/1887) |
Gostaria de parabenizar o Diego pela belíssima, entrevista!
ResponderExcluirAtenciosamente,
Ricardo Irigon Vinhas.
Valeu, Diego! Adorei tua entrevista. Bem se vê que se tornou um genealogista, não só um interessado. Agora é só compartilhar teus conhecimentos com as outras famílias bascas, que tanto anseiam encontrar suas raízes.
ResponderExcluirSaudações do Geni.
Carla Assenheimer
Bacana, irmão. O que começou por puro deleite, continuará, mas agora apara além de nossa casa. Que você possa ajudar e trazer alegrias para outras famílias.
ResponderExcluirObrigado a todos, Ricardo, Carla e Larissa, pelas palavras.
ResponderExcluirForte abraço!