segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Entrevista: Diego Larrabeiti M. Moreira




CBRGS- Qual seu interesse pelos bascos ?

Tomei conhecimento da “questão basca” ainda na escola, como aluno. A visão não era muito

positiva. Os professores de Geografia da educação básica, em geral, só conheciam os bascos

pela face das ações do ETA. Davam muito mais ênfase ao terrorismo do que às restrições

franquistas às liberdades dos bascos na Espanha. A identidade não ocupava posição central

nas discussões.

Mas eu sempre tive interesse pelas diferentes culturas e os bascos me despertavam atenção,

em especial pelas particularidades de sua língua, muito diferente de tudo o que há no contexto

geográfico em que ela se insere.

Mas foi quando soube que minha bisavó tinha origens bascas que o interesse antropológico

se converteu numa simpatia familiar e numa inesperada sensação de identidade e

pertencimento. Não conheci minha bisavó. Ela faleceu há 50 anos. E meu avô, filho dela,

faleceu quando eu tinha apenas dois anos. Mas essas coisas que envolvem elos familiares, às

vezes, simplesmente não se explicam. Eu me identifiquei.

CBRGS - Qual foi a sua maior influência, ou  maior motivador a manter esta relação com o país

de origem dos ancestrais?

Sempre gostei de História e Genealogia. As facilidades que as tecnologias nos facultam hoje

me permitiram aprofundar-me nesses campos de interesse. Sou do tipo que se comove

profundamente quando descobre, num registro de casamento, que o trisavô era um ebanista

(marceneiro) e que o pai dele era um herrero (ferreiro).

Isso aconteceu com pesquisas no campo da ancestralidade basca. Investigar esse passado

familiar tem reforçado bastante esse sentimento de identidade que tenho construído nos

últimos anos com essa comunidade.

CBRGS -  Conhece o País Basco?

Nunca pisei no velho mundo. Com dois filhos muito pequenos, adiarei por mais alguns

(poucos) anos a viagem. Pretendo ir com minha esposa assim que possível e entre nossas

prioridades estão destinos familiares, especialmente em Espanha e Portugal, de onde vêm

nossos ancestrais imigrantes mais próximos.

Isso certamente inclui o País Basco. E os centros especializados que guardam arquivos

históricos. Sem dúvida! São meu paraíso particular. Pra minha sorte um desses centros fica

exatamente na cidade em que minha bisavó nasceu, em Derio, Biscaia. Parada obrigatória.

CBRGS -  Quais as informações que dispõe sobre o País basco?

Como professor de Geografia do ensino médio e de pré-vestibular, posso dizer que aprendi

o suficiente para corresponder ao ensejo dos meus alunos, numa medíocre perspectiva

utilitarista – reconheço – em sua intenção de entrar numa faculdade. Eles precisam conhecer

o nacionalismo basco e a luta armada do ETA. Durante muito tempo, era o que eu sabia

reproduzir sobre o País Basco, além daquilo que qualquer consulta ao Atlas pode responder,

como relevo, clima, vegetação, hidrografia, nomes de províncias, capitais, etc. Pra isso nenhum

deles precisa de mim.

No entanto, padecemos de uma absurda escassez bibliográfica sobre o tema no Brasil. Hoje

tenho o livro de Ana Luiza Panyagua Etchalus como uma referência, reconhecendo o esforço

do seu trabalho no levantamento e sistematização de informações relevantes sobre o assunto.

A importância da casa, a estrutura matriarcal, a religiosidade ancestral, o sistema jurídico,

entre tantos outros aspectos ali presentes trazem uma contribuição muito valiosa para que os

brasileiros como um todo conheçam mais sobre os bascos.

CBRGS - Fez a árvore genealógica de sua família. Teria interesse em apresentá-la aos bascos

brasileiros?

Quando buscamos nossa ancestralidade pela via genealógica nós temos a certeza de que

começamos um trabalho muito difícil. Por isso é importante estabelecer metas e tentar

cumpri-las. É muito bom quando as alcançamos e podemos nos propor metas mais ambiciosas.

Comecei esse levantamento de minha ancestralidade basca em casa, ouvindo familiares. Com

eles obtive os primeiros dados, especialmente com minha tia-avó Maria Larrabeiti, única filha

viva de minha bisavó. Com ela descobri os nomes dos pais de minha bisavó basca que migrou

para o Brasil: foi a primeira geração. Descobri com ela também bem a o local e a data de

nascimento dela: Derio, 16 de agosto de 1882. Foi meu ponto de partida. Depois achei os avós

dela: foi segunda geração.

Estabeleci como meta seguir completando gerações sucessivas e hoje tenho cinco gerações

completas e mais da metade dos indivíduos da sexta geração de ancestrais bascos de minha

bisavó. Já encontrei alguns da sétima geração. São 124 ancestrais até o momento, em 18

meses de pesquisas. E esse número vai crescer, estou certo disso.

Tenho o maior prazer em compartilhar os resultados desse trabalho. Abaixo pode-se ver a

árvore de minha bisavó, com quatro gerações completas de ancestrais, ou seja, até os trisavós.

Árvore Genealógica



Repare quantos sobrenomes diferentes, quantas famílias numa só. Só nessa imagem temos

Larrabeiti, Goiri, Manzarraga, Vidaurrazaga, Iturreguy, Aspe, Goicoechea, Maurica, Arechaga,

Uribarri, Acha, Landaluze, Landaguren, Hormaeche, Torrontegui, Legarreta, Enderica,

Horbegozo Torre, Amezaga, Picaza, Berganza, Gorordo, Ugarte, Aguirre, Elguezabal, Orroño,

Urrutia, Eguzquiza e Pinuaga. E acima temos muitos outros.

Encontrei também muitos irmãos e primos desses indivíduos totalizando centenas de

familiares consanguíneos. Usando as ferramentas do site de genealogia Geni.com. onde exerço

as funções de curador, consegui encontrar descendentes dessas pessoas vivendo na Espanha.

Como o site permite a formação de uma grande “árvore mundial”, consegui, através do meu

trabalho, juntar minhas informações às informações de outros bascos espanhóis e confirmar

nossos parentescos.

CBRGS - O que te moveu a ofertar este trabalho para outras famílias?

Eu sou apaixonado pelo prazer dessas descobertas. E quero poder contribuir para que as

pessoas também possam descobrir mais sobre sua ancestralidade. E a gente tem grandes

chances mesmo de acabar encontrando parentes, mesmo que muito distantes, às vezes nem

tanto assim.

Ilustro com uma história. Tenho duas alunas. Karen Wajnztok e Adriana Wainstok. Elas se

conheceram na escola e estudavam na mesma turma. Um dia eu disse a elas: tem certeza

de que vocês não são parentes? Uma comentou sobre a rua onde morava e a outra passou

essa informação para o seu avô. Pronto. O avô de Karen e o bisavô de Adriana eram primos.

As famílias estavam separadas há décadas e se reencontravam a partir dessa descoberta.

Ninguém faz ideia da minha emoção por ter contribuído pra isso.

CBRGS -  Como chegou à Casa Basca do RGS e qual a impressão sobre o trabalho que vem

sendo realizado pelo grupo que está na organização?

A Casa Basca do Rio Grande do Sul surgiu pra mim através do facebook. Num dia em que

estava extremamente envolvido com as pesquisas, achei a página “Bascos no Brasil” e “curti”.

Ao mesmo tempo, na outra aba do navegador, eu comprava o livro “Alma Basca”, de Ana Luiza

Panyagua Etchalus. Minutos depois, a própria Ana Luiza me solicitou amizade na rede social.

Segredos de Mari? E foi através de Ana Luiza que conheci a Casa Basca do Rio Grande do Sul.

Acompanho à distância o trabalho realizado e encaro-o como uma maravilhosa iniciativa

cultural e comunitária, da qual espero, um dia, poder participar com minha presença e de

minha família.

CBRGS - Qual a sua expectativa em se integrar ao Grupo da Casa Basca do RGS, mesmo

residindo no Rio de Janeiro?

Minha expectativa é ótima. Tomo o conceito do sociólogo espanhol Manuel Castells, expresso

no livro “A sociedade em rede”: vivemos a “cultura da virtualidade real”. O trabalho que posso

realizar contribuindo com a Casa Basca do Rio Grande do Sul, apenas se valerá das redes

virtuais. Mas seu produto será absolutamente real. Essa é uma possibilidade do mundo novo

em que vivemos.

Nos dias de hoje, no convívio social, muitas vezes interagimos muito mais através das redes

sociais do que pelo contato direto e pessoal com nossos amigos e vizinhos,  não é mesmo?

Temos e-mail, facebook, twitter, skype e o bom e velho telefone. Creio que a distância não

será um obstáculo mas um motivador ainda maior para conhecer pessoalmente todos os

envolvidos nesse projeto sensacional.

Casa onde nasceu minha bisavó, em Dério, Biscaia. Larrabeiti Etxea.


Minha bisavó, Pura Larrabeiti Goiri (b.16/08/1882 – d.29/08/1963)


Francisca Larrabeiti Goiri, irmã de Pura. (b.02/04/1873)


Ambrosio Maria Larrabeiti Goiri, irmão de Pura. (b. 08/12/1875)


Bonifacia Larrabeiti Goiri (Boni), irmã de Pura. (b.14/05/1880)


Juan Larrabeiti Goiri, irmão de Pura. (b. 27/12/1884)


Presentación Larrabeiti Goiri (Presen), irmã de Pura. (b. 26/06/1887)

4 comentários:

  1. Gostaria de parabenizar o Diego pela belíssima, entrevista!

    Atenciosamente,

    Ricardo Irigon Vinhas.

    ResponderExcluir
  2. Valeu, Diego! Adorei tua entrevista. Bem se vê que se tornou um genealogista, não só um interessado. Agora é só compartilhar teus conhecimentos com as outras famílias bascas, que tanto anseiam encontrar suas raízes.
    Saudações do Geni.

    Carla Assenheimer

    ResponderExcluir
  3. Bacana, irmão. O que começou por puro deleite, continuará, mas agora apara além de nossa casa. Que você possa ajudar e trazer alegrias para outras famílias.

    ResponderExcluir
  4. Obrigado a todos, Ricardo, Carla e Larissa, pelas palavras.

    Forte abraço!

    ResponderExcluir