terça-feira, 13 de março de 2018

Primeira visita a Bilbao de um Gaucho de origem Basca. (Felipe Etchalus Thadeu)

           
Aitor Bilbao Izaguirre com Felipe Etchalus Thadeu no San Mamés (Estádio do Athletic Club)
 
             Muito possivelmente, por ter crescido na companhia de minha tia, Ana Luiza Etchalus, e por ter acompanhado parte do processo, encabeçado por ela, de resgate da herança do sobrenome Etchalus, o qual também carrego com orgulho, é que, ao me ver morando em Valladolid, na Espanha por conta de um intercâmbio universitário, não pude deixar de conhecer mais de perto a realidade do povo basco. 
Então, assim que me estabeleci no meu novo lar, comuniquei esse desejo a minha tia, que, após poucos minutos de espera, me respondeu com alegria que um amigo, Aitor, me estaria esperando em Bilbao quando chegasse e seria meu guia durante o passeio. E de fato, assim que cheguei em Bilbao, lá estava Aitor me esperando, de braços abertos e dois ingressos para conhecer o estádio de San Mamés, no jogo que aconteceria mais tarde, Athletic de Bilbao versus Las Palmas. Confesso que o futebol foi, de longe, o que menos me chamou atenção na partida. Acabaram por roubar minha atenção o estádio, inaugurado em 2013 e premiado em 2015 no World Architecture Festival como o melhor edifício desportivo do mundo de nova construção, e a torcida, que conseguiu esquentar o clima baixo um frio de 4ºC. 
            Após o jogo, eu e Aitor pegamos um trem, que nos levaria a Portugalete, a cidade onde vive. Chegando em Portugalete, já estava bem tarde, então nos despedimos e eu fui para o hotel, enquanto ele seguiu para casa. 
No dia seguinte pela manhã, meu hospitaleiro guia passou em meu hotel e me levou para conhecer a Puente de Vizcaya, uma ponte projetada e construída no século XIX, que une as duas margens da ría de Bilbao, a cidade de Portugalete ao bairro Las Arenas, pertencente ao município de Getxo. A construção, típica da era da revolução industrial e feita de ferro, foi a primeira do mundo de sua tipologia e é a mais antiga ponte de transbordamento do mundo ainda em operação. Em 2006, foi declarada patrimônio da humanidade pela Unesco. A estrutura é realmente impressionante e a vista lá de cima também encanta. 

Bizkaia Zubia (Puente de Viscaya)
            Desci da ponte pelo lado de Las Arenas, no município de Getxo, e seguimos caminhando pela costa até o Puerto Viejo de Algorta. Ao chegar, a sensação era de ter voltado no tempo. Me deparei com uma pequena vila de pescadores, com vielas, tabernas e restaurantes típicos que parecia não ter sofrido o passar do tempo. Entramos em uma taberna e ali Aitor me apresentou entusiasmado para seus amigos que trabalhavam no local como “o basco do Brasil”. Surpresos, me fizeram perguntas sobre o Brasil e me ofereceram um caldo quente para me esquentar. 
              Essa mescla de surpresa e fascínio que acontecia ao ouvirem da existência de herança basca no país do futebol e do carnaval se repetiu muitas vezes ao longo do meu passeio. Voltando a Portugalete, nos deparamos com uns tocadores de Txistu, que ao ouvirem de Aitor que eu vinha do Brasil, puseram-se a tocar “Carnaval, carnaval” em minha homenagem. Então, paramos para o almoço e Aitor me levou até sua casa. Lá, conheci Itziar, sua esposa, seu filho e sua sogra. Sua esposa havia preparado um almoço vegetariano especialmente pra mim e a comida estava fantástica. 
               No fim da tarde, eu e meu guia local nos dirigimos para Bilbao para ver o desfile de carnaval que aconteceria na cidade. Me deparei com um carnaval, de fato, muito diferente do que estou acostumado no Brasil, mas de maneira alguma menos fascinante. O espírito de carnaval atingia todas as idades. Vi desfiles de crianças, de idosos, de famílias. Todo o tipo de gente fantasiada e desfilando pelas ruas. Uma energia realmente contagiante. 
               Após o desfile, fui levado para conhecer o centro histórico de Bilbao, chamado de Casco Viejo. Ali conheci a Plaza Nueva, o Mercado de la Ribera, ao lado da Igreja de San Antón, um edifício gótico do século XV. Por fim, encontramos Itziar e caminhamos juntos até a Basílica de Begoña, a santa padroeira de Bilbao e Bizkaia. 
              Após o passeio pelo casco viejo, voltamos a Portugalete para aproveitar mais um pouco da noite de carnaval basca. Ali, passamos por uma série de bares e fui apresentado para um sem número de pessoas, todas muito simpáticas e interessadas no que eu tinha para contar. Por fim, paramos em um bar cujo dono conhecia muito do país basco francês, local de origem do sobrenome Etchalus. Esse foi um dos momentos mais emocionantes da viagem, porque o homem disse que um de seus melhores amigos havia sido um Etchalus e me presenteou com um calendário do país basco francês. O dia seguinte foi o dia dos museus. Primeiramente, me dirigi ao museu basco, situado no casco viejo de Bilbao, o qual recomendo muito, pois conta toda a história do povo basco desde os primeiros tempos até a modernidade. Após, fiz uma visita ao famoso Guggenheim, e lá pude experienciar todo o fascínio da arte moderna. A estrutura do museu, por si só, já é de fazer o queixo cair. Cheio de curvas e formas irregulares cobertas por placas de titânio, na beira da ría de Bilbao, o museu faz por merecer o status de cartão postal que recebe. As exposições tampouco ficaram para trás. com muitas experiências sensoriais e obras inéditas, o resultado almejado (e obtido) foi a ressignificação das noções de tempo e espaço através da arte. Realmente, uma experiência única. 

Guggenheim Bilbao Museoa.

               Por fim, reservei a última parte do dia de domingo para visitar o museu de belas artes de Bilbao. Mais um edifício fantástico que, dessa vez, me levou por um passeio pela história da arte. O acervo do museu de belas artes é vasto e contém desde obras que remontam ao séc. XIII até obras de arte contemporânea. O que me chamou positivamente a atenção é que o museu reserva uma seção inteira dedicada à arte basca, com propósito de proteger os valores culturais da comunidade local. 

Museu de Belas Artes de Bilbao (Bilboko Arte Ederren Museoa)

               Minha experiência no País Basco foi encantadora e completa. Ao longo da viagem, não apenas me desloquei por diferentes lugares, mas também pelas diferentes épocas. Visitei a Idade Média, por meio das obras medievais do museu de belas artes, passeei pela vila de pescadores de Getxo do séc. XVII, senti a chegada da revolução industrial ao atravessar a Puente de Vizcaya e, por fim, experimentei o mundo contemporâneo marcado pelas placas de titânio do museu Guggenheim. 
               Sou muito grato por ter podido conhecer um pouco mais dessa terra de aventureiros e pescadores, de gente batalhadora e hospitaleira, apaixonada por sua terra e orgulhosa de suas raízes.

Felipe Etchalus com grupo de tocadores de Txistu* de Bilbao. 
(* O Txistu é um instrumento de sopro tipicamente basco)
Texto e Fotos de Felipe Etchalus Thadeu.